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Você conhece a NAU?

January 21, 2021 by Jorge Wakabara in música

Vange Leonel não começou na abertura da novela Vamp com Noite Preta. Aliás, muito pelo contrário.

Volta para 1980. Vange fez parte da banda Os Camarões, de ninguém menos que Nando Reis. E mais: Vange e Nando eram primos!

O primeiro registro em disco da voz de Nando é ao lado de Vange: era o LP Festival da Feira da Vila Madalena, com os participantes do dito festival de 1980 (e a gravação saiu no mesmo ano). A música, tocada pelos Camarões, é chamada O Cheiro de Beterraba e… é de autoria de Vange!

E olha o babado: a primeira faixa desse disco é Nêgo Dito, de Itamar Assumpção, que inacreditavelmente ficou em 3º lugar. Outro que concorreu foi Paulo Miklos, futuro colega de Nando nos Titãs, com Desenho, composição dele e de Arnaldo Antunes. Nem Os Camarões, nem Miklos levaram prêmio na Feira – mas eles estão lá, registradinhos no LP.
(Desenho é bem, mas bem, mas beeeem Arnaldo Antunes! Engraçado perceber isso.)

(Aliás, para fins de esclarecimento: costuma-se dizer que os Titãs se conheceram no Equipe, colégio de São Paulo. Errado: nem todos. Nando realmente fez Equipe, como Miklos e Antunes, mas os dois eram mais velhos. Quando Nando entrou, eles já tinham se formado! Portanto, na época do lançamento desse disco, eles não se conheciam!!!)

Ah, outro que participou do festival e do LP é Celito Espíndola, da família Espíndola. Ele é irmão de Tetê, Alzira e do resto do pessoal (que eu saiba são 6 irmãos) e fez parte da banda Tetê e o Lírio Selvagem.

Mas, certo. Então Vange começou ali na Feira da Vila.
E depois?
Diz que ela fez parte de uma banda chamada Estéreos Tipos que, apesar do nome bem sacado, não foi muito para frente.
E aí, bem…
Depois teve a NAU.

Meio pós-punk, meio heavy metal (na verdade, sinceramente eu acho BEM metal), a NAU foi fundada em 1985. Era formada por Vange (vocal e guitarra), Mauro Sanchez (bateria), Zique (guitarra) e Beto Birger (baixo). Eles gravaram uma fita demo que tocou na 89FM em SP e na Maldita no Rio. Nessa época, Vange também se aventurava como atriz no grupo XPTO.
Aí eles gravaram para uma coletânea da Baratos Afins de pós-punk que virou artigo cult maravilhoso, a Não São Paulo, lançada em 1986. Só que a coisa parece que atrasou e o primeiro volume da coletânea, que saiu em 1986, saiu sem NAU. Ou seja, entre o primeiro e o segundo volume da Não São Paulo (que, aí sim, tinha NAU), acabou rolando a gravação e lançamento do primeiro disco da banda em si, em 1987.

A história parece que foi a seguinte: Sanchez, o baterista, foi afastado por problema de saúde. Dany Roland, o baterista da Metrô, o substituiu às pressas. Não sei se isso foi antes ou depois da gravação do segundo álbum da Metrô (na prática o terceiro, se contarmos o lançado quando a banda se chamava A Gota Suspensa), que era o cult-misterioso-exótico A Mão de Mao de 1987.
Diz que foi Roland que intermediou o contato da NAU com Luiz Carlos Maluly. Sabe quem é? O cara que já havia produzido coisas do Rádio Táxi, a própria Metrô e… o RPM e suas Revoluções por Minuto de 1985, disco do BRock que vendeu mais que pão quentinho! Para a NAU, esse encontro com Maluly significou um contrato de três anos com a CBS.

No disco homônimo NAU, a música de abertura, Bom Sonho, é composição de Vange. Ela interpreta já como uma supercantora, cheia de personalidade, nos seus malabarismos vocais que viraram marca registrada – e que, estranhamente, estão quase ausentes em Noite Preta em si. Mas essa faixa é a única do álbum que ela assina sozinha: divide Corpo Vadio e As Ruas com Zique, Diva e As Barcas com Zique e Birger, e Novos Pesadelos com Zique, Birger, Sanchez mais Rosália Munhoz, das Mercenárias. A última música, Nada, é dos quatro integrantes.

Algo que a gente também precisa ressaltar: a única música do disco que não é de nenhum integrante é Linhas Esticadas. É meio valsa, romântica e esquisita – gosto da melodia do refrão, cheia de agudos.
As compositoras são Cilmara Bedaque e Laura Finocchiaro.

Cilmara foi a companheira de vida inteira da Vange, até a artista morrer em 2015. Compôs outras coisas com Vange na carreira solo dela. Não sei exatamente quando elas começaram um relacionamento, mas em 1995, quando Vange saiu do armário publicamente, elas estavam juntas.
Já Laura… Quem foi moderno ou candidato a moderno nos anos 1990 (ou seja, eu estou nessa lista) sabia quem era. Irmã da roqueira que chegou a ter fama underground Lory F, Laura ganhou um tremendo destaque quando ganhou um concurso para tocar no Rock in Rio II, em 1991, no mesmo dia de ninguém menos que Prince! A própria diz que ela não se inscreveu – quem mandou a fita foi um fã! Loucura, né?

Mas quando o disco NAU saiu, o ano ainda era 1987, pré-Rock in Rio. No velório de Vange, Laura fez um discurso lembrando que a amiga foi quem financiou suas primeiras gravações no início da carreira em SP.

Depois, Laura ainda ficaria famosa por outro motivo: ela assinava a trilha sonora maravilhosa do programa Casa dos Artistas, no SBT!
(Ah, e sim: ela se assumiu bissexual em 1992.)

Laura Finocchiaro nos anos 1990

Laura Finocchiaro nos anos 1990

A NAU se desfez em 1989. Vange partiria para carreira solo e o primeiro álbum, Vange, de 1991, é o que tem Noite Preta. Em 1996, ainda saiu o EP de Vange Vermelho, que não fez muito sucesso. Com isso, ela abandonou precocemente a carreira musical e focou na literatura. Escreveu livros, peças. E nos deixou muito cedo.

A música-título do EP Vermelho me lembra a NAU na levada.

Mas, AH, tem mais uma coisa!

Em 2018, surpresa: foi lançado o disco perdido da NAU, gravado 30 anos antes. Antes da banda acabar, houve uma tentativa de segundo álbum em 1988… e sim, a viúva de Vange, Cilmara, descobriu a fita dentro de uma caixa em 2017! Tadaaah! Ela disse que a fita estava melada, que não sabia se conseguiria recuperá-la. O milagre foi feito, e o álbum outrora rejeitado pela gravadora voltou à vida.

Eu gosto, viu? A NAU tem um ar meio banda do Café Piupiu (quem tem a referência sabe o que eu tô dizendo), mas que na época fazia total sentido.
Se a NAU tivesse continuado, o que faria hoje?

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January 21, 2021 /Jorge Wakabara
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O dia em que a música afro encontrou o BRock

November 27, 2020 by Jorge Wakabara in música

Estou meio viciado em BRock nessa quarentena, deu para perceber? O som jovem dos anos 1980 já foi apontado como reflexo de diversas coisas: a trilha da reabertura política, uma resposta à MPB que surgiu nos festivais e que não falava a língua da nova geração, uma combinação explosiva de Circo Voador + rádio Fluminense + o filme Menino do Rio + juventude entediada em Brasília + punks de SP e outras maravilhosas incidências.

Só que o BRock batia bastante na tecla do punk, do pós-punk, sons darkzões. Lá fora, tinha rolado também a incidência forte do reggae, que por aqui foi deglutida e festejada principalmente por Gilberto Gil, mas que praticamente não respingou nas bandas jovens que surgiram fora uma ou outra exceção (os Paralamas, por exemplo).

E foi no meio da Brasília de Legião Urbana, Capital Inicial e Plebe Rude, tudo politizado e angustiado, que surgiu um sol. O Obina Shok sonoramente era mais próximo do axé da Bahia que do rock dos colegas – talvez seu único primo na turma era o supracitado Paralamas do Sucesso, que já estava estabelecido no Rio.

Para dar uma localizada: o Magia de Luiz Caldas, que tinha Fricote, saiu em 1985, Sarajane abriu a roda em 1986, o disco de estreia de Daniela Mercury veio em 1992 – recomendo o documentário Axé: Canto do Povo de um Lugar, que está na Netflix e todo mundo que curte música brasileira devia assistir. Ao mesmo tempo: o primeiro do Legião também saiu em 1985, o do Capital sairia em 1986 e o incrível EP da Plebe, O Concreto Já Rachou, veio em 1985. Paralamas já havia lançado dois álbuns quando soltou Selvagem? em 1986 com Alagados.

Obina Shock já aparecia diferente de tudo porque, além da inspiração claramente afro (juju music, highlife), era uma banda com estrangeiros. Jean Pierre Senghor é neto de ex-presidente do Senegal, filho do embaixador do país e, adivinha, senegalês. Roger Kedyh era gabonês exilado. Winston Lackin era do Suriname e estava estudando no Instituto Rio Branco, a reconhecida escola brasiliense de diplomacia e relações internacionais. Juntaram-se a eles os brasileiros Henrique Hermeto, Maurício Lagos, Sérgio Galvão e Hélio Franco. A banda, assim como as outras, mandou uma demo para a carioca Fluminense FM, a emissora de rádio apelidada Maldita. E o pessoal gostou de Lambaréne (que, aliás, é o nome de uma cidade do Gabão).

Por que a gente fala que o Obina Shok é BRock? Bom, eles eram contemporâneos das outras bandas e fizeram o mesmo caminho, apesar do estilo musical cheio de suíngue diferente do resto. E esse caminho era a Maldita, show no Parque Lage com produção da galeria do Circo Voador e contrato com gravadora. Em myene, uma das línguas (e dos povos) do Gabão, obina shok quer dizer algo como “união da dança".

(Outra ponte do Obina Shok com o BRock é o guitarrista Henrique Hermeto em si. Ele chegou a tocar em uma banda chamada Os Metralhas, antes do Obina, com André Muller, que virou baixista da Plebe, e Marcelo Bonfá, que virou baterista do Legião.)

Quando o disco saiu em 1986, Obina Shok já tinha renome entre os iniciados. Tanto que a música de trabalho, a maravilhosa Vida, tem as participações de Gal Costa e Gilberto Gil nos vocais.

Tudo, né? O ombrinho só no sacode.

E é tão tudo que a rainha Alcione chamou os caras para um especial dela na Manchete, Fruto e Raiz, no mesmo ano de 1986.

Vida é o maior hit da Obina Shok, indiscutivelmente. Foi regravada pelo próprio Gil em 1987, por Elba Ramalho com Lulu Santos em 1991, pelo Ara Ketu em 2000 e por Gil novamente com sua filha Preta Gil em 2011 (num medley com Andar com Fé).

O primeiro álbum tem dedo do Kedyh em quase todas as composições. Vida, por exemplo, é dele com Maria Juçá, a produtora-diretora do Circo Voador. Lambaréne é dele, sozinho. A única gravada que não tem co-autoria dele é o reggae Africaner Brother Bound, um libelo contra o apartheid de Senghor, Hermeto e Gil, que também participa dessa faixa.

Apesar do sucesso do primeiro álbum, Maurício Lagos e Sérgio Galvão saíram do grupo. E sabe quem entrou? Nada menos que… Nara Gil.
Sim: a filha mais velha de Gil, meia-irmã de Preta, Bela e Bem não foi apenas a DJ Black Boy de Armação Ilimitada – papel tão perfeito que ela nunca se livrou dessa referência, mesmo depois de tanto tempo!

Nara nunca lançou um disco próprio. Mas já fez várias coisas ao lado do pai. Tipo… essa versão de Haiti no canal de YouTube dele!

Bom, voltando: Nara fez parte da formação do Obina Shok no segundo álbum mas Salleé, de 1988, flopou. Uma pena. Não está nem no Spotify e em vinil é mais caro e mais raro que o primeiro.

O que rolou depois?

Senghor tocou com Marisa Monte, Jorge Vercillo e estava na cozinha do primeiro disco do Cidade Negra, Lute Para Viver (1990), nos teclados da maior parte das faixas. Ele acabou virando quase fixo da banda – quase sempre estava lá, apesar de não aparecer muito em créditos de gravações. Em 2010, voltou de mala e cuia para Dakar. Apresenta um programa na rádio senegalesa chamado Hora do Brasil – olha o artigo do UOL sobre ele publicado nesse ano.
Kedyh, que tinha problemas de saúde, voltou para o Gabão e morreu lá em 2018 – teve um AVC fatal.
Lackin virou um político bem importante do Suriname. Foi ministro de relações exteriores do país entre 2010 e 2015. Morreu em 2019.

Um clique do Facebook de Henrique Hermeto:

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