As mais tristes para dançar

O país do samba sabe disso faz tempo. Foi a minha amiga Verônica Veloso, há muito tempo, que chamou a minha atenção para como as letras dos sambas podem ser tristes e essa coisa de cantar e dançar exaltado sobre esses temas pode ter um efeito de exorcizar as dores do coração. Nelson Cavaquinho e coisas como A Flor e o Espinho e Folhas Secas; algumas do Cartola; Lupicínio Rodrigues e sua eterna dor de cotovelo; coisas emblemáticas como Triste Sambista do repertório de Carmen Miranda e Tristeza Pé no Chão de Clara Nunes.

Mas não é só na música nacional que existe essa tendência à sofrência, a gente sabe. E pensando nas lágrimas que podem cair na pista de dança e na Robyn que virou figura aclamada depois de Dancing on My Own de 2010, uma das mais lindas músicas pop para dançar já feitas, decidi fazer uma lista de Crying at the Discoteque. Lembrando que a original Crying at the Discoteque do grupo sueco Alcazar, de 2000, é uma falsa música de sofrência sob estrobos porque as lágrimas, nesse caso, são de alegria segundo a letra.
Tsc, tsc, tudo para ser um clássico. E até foi, durante uns episódios de Queer As Folk, aquele seriado gay que envelheceu mal pela falta de diversidade assim como quase todos os seriados gays que existiram até hoje.

Então, com vocês, a lista Crying at the Discoteque sem a música Crying at the Discoteque!
(Recebi a colaboração luxuosa d’Os Princesa Bia Bonduki e Ana Laura Mello, do Daniel Beoni, da Flávia Akemi e do Pedro Nere. Não incluí praticamente coisa alguma do que eles sugeriram mas obrigado mesmo assim kkkkkkkkKKKKKKK)

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#1: No More Tears on The Dancefloor (2011) - Anders I Fahrenkrog

É ruim demais e por isso que é bom. Sabe o hit 99 Red Balloons da Nena? Foi escrito e produzido por Uwe Fahrenkrog-Petersen, uma das metades da dupla. A outra é Thomas Anders, que faz parte do Modern Talking, dupla alemã bem eletropop anos 1980. Aquele popzinho nojento guilty pleasure que a gente AMA.

#2: I'm a Ruin (2015) - Marina Diamandis

"I'll ruin, yeah, I'll ruin you (I'll ruin you)
I've been doing things I shouldn't do (Things I shouldn't do)”

É aquela música de chorar de arrependimento na pista. Com direito a um dos melhores vocalises do pop: ye-yeah, ah-ah-hah, uh-uh-uh, ih-yeah! Se você conseguir fazer tudo afinadinho, parabéns pela extensão vocal.

#3: You Haven't Seen the Last of Me (Dave Audé Mix) (2010) - Cher

Esse é apenas o primeiro bate-cabelo da sofrência bem performance drag e não chora não que vai ter mais.

Essa é para ouvir no momento de fim da tristeza, bye bye, não precisa voltar - você está quase recuperado e só precisa de um empurrãozinho na pista. There will be no fade out, this is not the end! Arrasa, bi!
(E o clipe não é oficial, foi feito por fãs! Que luxo!)

#4: Your Type (2015) - Carly Ray Jepsen

Não poderia faltar a melhor aluna da Robyn: Carly Rae Jepsen, a verdadeira atual princesa do pop no coração dos iniciados. "I bet she acts so perfectly / You probably eat up every word she says / And if you ever think of me / I bet I'm just a flicker in your head” - eita, amiga, tá na pior, né… Fico triste não porque me reconheço, mas porque ela se humilha demais pelo boy, credo.

#5: Dancing on My Own (2010) - Robyn

Um clássico e uma ótima dobradinha com a anterior. Será que essa música algum dia vai envelhecer? Sim, porque ela já tem 19 aninhos! Acredita? Quando toca todo mundo corre para a pista, ainda. Quando ela diz “I'm not the girl you're taking home", a gente sente o impacto real oficial.W

#6: It's Not Right But It's Okay (Thunderpuss Remix) (1999) - Whitney Houston

Não sei vocês mas provavelmente essa foi uma das músicas que eu mais dancei na vida. É sério! Daquelas músicas para cantar em plenos pulmões quando você acha que ele está te traindo, a I Will Survive da minha geração. E sim, era essa versão remix, de 9 minutos e pouco. Thunderpuss fez Whitney voltar ao topo, coisa que ela não tinha mais conseguido desde a trilha do filme The Bodyguard. Virou um hino gay onipresente! Confira nesse link o próprio Thunderpuss contando como foi que esse job dos sonhos parou em suas mãos.

#7: Everything is Embarrassing (2013) - Sky Ferreira

Amo a batida e a letra dessa música. É para dançar pensando naquele boy que te desprezou, você sente uma raivinha mas no fundo rola uma esperança. “Telling me that basically you're not looking out for me” - afffeee, eu sei, mas peraí, xô tentar uma coisinha… E é daquelas para dançar com emoção. Aqueles passos que você criaria se fosse coreógrafo de jazz contemporâneo - eu sei que você já quis ser coreógrafo de jazz contemporâneo. E eu sei porque todo mundo já quis…

#8: Dance in the Dark (2009) - Lady Gaga

“Baby loves to dance in the dark / 'Cause when he's lookin' she falls apart" - essa música é linda e acho que ainda não deram o devido valor para ela. Fala do poder que a pista de dança te dá, mesmo que você esteja se sentindo ou se sinta no geral um lixo, para ser a pessoa mais poderosa e brilhante do mundo. Ninguém precisa saber, ninguém precisa ver. Find your freedom in the music!

#9: I Wish We Were Leaving (2014) - Bright Light Bright Light feat Elton John

Além da participação de Elton John, o que já é bem exótico, essa música tem um cheirinho de God Only Knows do The Beach Boys em uma parte-chave da melodia. God Only Knows é uma das músicas mais lindas da música pop - e não sou só eu que acho, o Sir Paul McCartney já disse que ela era the greatest song ever written. Uau! Como God Only Knows não é exatamente voltada para a pista, a gente fica com essa, que também tem uma letra tocante: "And one day you'll make somebody so happy / But it won't be me". Ave. Para dançar com um lencinho Kleenex.

#10: Wings (2014) - HAERTS

A letra não é necessariamente tão triste, mas a voz da vocalista Nini Fabi é tão tristonha que para mim a música acaba tendo uma carga emocional maior.
Mas OK, a letra é meio triste sim: “People never smile to say goodbye / Leaving means there's nothing left to try / But I broke my wings for you / I smiled as you untied our love for good".
Wings aparece com destaque em momento crucial do filme Com Amor, Simon. Achei esse longa um tanto white boy problem, um tanto heteronormativo, mas muita gente achou fofo portanto eis aí a musiquinha dele.

#11: Crying on the Dance Floor (2017) - RuPaul

Uma drag music por uma drag queen. Essa é para você que está chorando mas não quer chorar: "You won't see me crying on the dance floor!” E fica repetindo isso até acreditar!

#12: My All (Morales "My” Club Mix) (1999) - Mariah Carey

Just one more night - essa é para você que está se rastejando pelo boy. Eu hein. Tudo bem, ouve aí mas depois se valoriza e volta para a da Whitney que está mais para cima. E engole esse choro!

#13: Nobody's Supposed to be Here (Dance Mix) (1998) - Deborah Cox

A sequência da boate era essa, então achei de bom tom fazer a progressão aqui também: My All da Mariah e depois a fodona Deborah Cox botando o pé na porta com Nobody's Supposed to Be Here. “How did you get here? Nobody's supposed to be here!!!” Para gritar junto, principalmente na hora do no-no-no-no-no-no-no-UUUUUU!

#14: Crying for No Reason (2014) - Katy B

O começo é meio parado - aguarde um minuto e pouco para as batidas aparecerem. A letra é esquisita: ela diz que está chorando sem motivo, mas ao mesmo tempo conta que escondeu e enterrou todos os problemas dela e agora eles vieram à tona. E ela ainda pede perdão… Então está chorando por alguma razão sim, amore! Ou várias. Enfim, se você se identificar com alguém que não sabe se expressar direito, chore com essa.

#14: Don't Leave me This Way (1986) - The Communards feat Sarah Jane Morris

Essa música tem uma história longa: ela começou como um R&B do Harold Melvin & The Blue Notes feat Teddy Pendergrass em 1975. Já tinha bastante suíngue. Aí, em 1976, ela ressurgiu. Inicialmente seria do repertório da Diana Ross mas acabou nas mãos, ou melhor, no gogó de Thelma Houston (que não é parente de Whitney Houston). Se a primeira versão fez sucesso, a segunda, de pegada disco, virou um sucesso internacional. Uma década depois o incrível Jimmy Somerville e seu companheiro de banda Richard Coles nos agraciava com a versão do Communards, que ainda trazia um feat com Sarah Jane Morris, cantora da escola do jazz.
Essa música virou um símbolo da luta contra a Aids, tanto na versão de Thelma quanto na do Communards. Tanto Somerville quanto Coles são abertamente gays e viram sua comunidade sofrer com a doença.

#15: Always on My Mind (1988) - Pet Shop Boys

Para mim essa é a música mais linda da lista inteira. Para quem se arrependeu e quer voltar. Chora, baby - a versão do Pet Shop Boys já foi considerada em artigo do The Telegraph em 2004 um dos melhores covers jamais cometidos. Assim como a música anterior dessa lista!

Abaixo, a playlist no Spotify ;) Chora não, coleguinha!

Não gostei de Rocketman, mas talvez você devesse ir mesmo assim para tirar suas próprias conclusões

Para começo de conversa, tenho muita dificuldade com textos críticos de cinema que vejo por aí. Eles não me parecem muito práticos: basicamente não me dizem se eu deveria pagar uma grana para assistir no cinema (que está pela hora da morte!), se eu deveria esperar chegar na Netflix, se é melhor assistir na telona do cinema do que na telinha da TV, se não vale a pena perder o meu tempo. Às vezes é legal saber da cinematografia, às vezes é interessante pensar no contexto histórico e correlacionar a obra com outros filmes do mesmo diretor, mas que tal me dizer - com argumentos, faz favor! - para quem esse filme é, quem vai gostar e quem definitivamente não vai gostar? Não raro me vejo assistindo um filminho despretensioso no avião e pensando “pô, por que ninguém me disse que eu ia amar esse filme??” Sim, é com você que estou falando, caro crítico de cinema.
Por isso tudo, vou tentar explicar aqui porque não gostei de Rocketman, mas sei lá… talvez você goste. Vamos tentar!

It’s a little bit funny / this feeling inside…

It’s a little bit funny / this feeling inside…

Primeiro: não sou o maior fã de Elton John. Você é? Sim? Então talvez você ame. Muito bem.

Uhu!

Uhu!

Em segundo lugar: existem, para mim, dois tipos de musicais. O tipo Bohemian Rhapsody e Nasce uma Estrela, que tem música mas ela entra num contexto, geralmente são de artistas cantando suas músicas no palco, em estúdio de gravação ou em um momento de composição. Costumo gostar desses.

E existem aqueles tipo Disney, tipo Evita, tipo Glee: a personagem é rejeitada e começa a cantar pela rua sobre a sua dor, o feirante e a mocinha carregando um pão entram no coro, o trânsito para, os motoristas saem do carro e começam a fazer uma coreografia… Como sobrevivi a uma sessão inteira de La La Land? Socorro! Para mim o ápice disso é West Side Story no teatro, quando a Maria ouve a campainha e pede para a pessoa esperar um minutinho… cantando.
Isso acontece mesmo na peça? Acho tão surreal que às vezes penso que foi coisa da minha cabeça.

Então sou o tipo de gay que não gosta desse segundo tipo de musical. Confisquem a minha carteirinha do vale dos homossexuais, me prendam, declaro-me culpado! I hope you don’t mind.

Isso tudo posto, chegamos ao cerne. Sobre o que é Rocketman? Sobre Elton John, claro, um cantor-compositor incrível, que inclusive está vivo e é um dos produtores executivos do filme - acho importante salientar essa parte. É, portanto, uma visão bem parcial, imagino. Só daí já dá para entender o tanto que o personagem John Reid, que é uma espécie de interesse amoroso de Elton (para não dar muito spoiler), é pouquíssimo complexo, retratado de maneira caricata.
Mas, de novo, sobre o que é Rocketman? Ele é muito focado no fato de Elton ser adicto. A história já começa com ele chegando em uma clínica de reabilitação. É sabido que isso é um ponto de virada na vida dele, e se transformou em uma espécie de bandeira ao lado de outra ainda maior, a importância da pesquisa sobre o HIV e a campanha contra a Aids. Em Casa Versace, o livro, a autora Deborah Ball conta que ele foi o grande responsável por uma intervenção com Donatella Versace, que era usuária de cocaína. Na época ele já estava sóbrio.
Encarando o filme como uma trajetória de alguém que se descobre adicto, vai até o fundo do poço e depois se recupera, não acho o desenvolvimento do roteiro bom: você entende a família disfuncional e o vazio que esse Elton fictício sente, mas esse fundo do poço não me convenceu. Incomodou-me uma cena em especial - é spoiler, então se você não quiser saber, pare de ler agora e, se quiser, volte depois desse próximo parágrafo.

A cena da orgia, para mim, é muito muito muito MUITO moralista. Incomoda-me aqueles olhares todos encarando-o. Se ele não estava se sentindo bem com aquilo, há outras maneiras de resolver isso cinematograficamente. Olhos julgadores de participantes da própria orgia colocam o julgamento no olhar do outro, e não no do próprio personagem. Ele se incomodava com o que os outros iam pensar ou como ele mesmo estava se sentindo? Pendeu para a primeira opção. Achei bem nada a ver, e se é isso mesmo que o Elton da vida real sente quando relembra seu passado, sugiro mais terapia.

Então, por que não gostei do filme? Foi só por causa de uma cena? Não.
É que outra história, ao meu ver mais latente e que é o que diferencia a história de Elton John da de vários outros artistas, é: como ele, um cara que veio da classe trabalhadora inglesa e que tinha muito talento mas não tinha uma beleza clássica padrão nem uma sexualidade padrão, venceu num mundo onde ser padrão era algo visto como essencial para ser bem sucedido? Como aquele queer que se vestia de maneira tão extravagante que chegava a ser agressiva para os normativos (aliás, o figurino é 10/10, parabéns para Julian Day que também assina os looks de Bohemian Rhapsody) conseguiu ainda assim vencer pelo talento e pela força de suas músicas?
Era essa a história que fui ver, e essa história ficou mal contada.

E Taron Egerton? Canta bem, atua bem. Mas gostei mais no trailer que no filme em si? Ops!

E Taron Egerton? Canta bem, atua bem. Mas gostei mais no trailer que no filme em si? Ops!

E aí, você vai assistir? Você gosta de musical? Você gosta de Elton John? Se sim: assista!